Tudo depois da poesia é uma merda.
Ademar Santos

sábado, 30 de janeiro de 2010

Filme

Bem podíamos, é verdade,
acudir por separado ao cinema,
sentar juntos ao fundo da plateia,
nas poltronas pior iluminadas,
prendermos a vista no ecrã,
de olhada impenetrável,
e atendermos só ao palpitar,
ao ritmo do pulso galopante,
ao calor dos corpos e aos odores,
aos silêncios ponteados de suspiros
arfados, ansiosos. Ah...
Podíamos mesmo até
beijar-nos aproveitando
um bombardeio qualquer,
uma perseguição ou outra
ou a barafunda duma família latina
em volta da mesa do jantar
disputando uma herança.

Podíamos tanta pouca coisa!

Mas afinal sempre vem o fim do filme,
rolam os créditos,
prendem-se as luzes,
abrem-se as portas
e lá fora está muito frio
para a falta de cantos escuros que nos permitam
abrir as narinas e aspirar
com força
os odores que esvaecem.

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