Tudo depois da poesia é uma merda.
Ademar Santos

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Desconcerto

(Prestidigito-te veloz em versos que nem lês,
taciturnando-me desprezativo.)
—E se eu calo, falas tu, nem que seja à intempérie?
—Não, não —digo-me que diz ele, o emudecido falante—,
só quando tu (eu) falas é que falo eu (ele).
—Devo então fiar diálogos comigo
como se tu comigo os fiasses
e debater contra o espelho que me não devolve a razão
os silêncios que me prestas transpirando sons surdos?
—... —nem por ele respondo.
(O silêncio é uma imensidade de búzios unissonantes.)
—Que não ouço a resposta! —grito.
—Qual era pergunta? —as mãos interrogam.
(Até que enfim os ecos findaram. E eu, agora, digo o quê?)

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Point of no return

Agora é virar a página,
escrever ponto,
viver não, sonhar não,
imaginar sem sentimento.

É alimentar a desconfiança,
que deposita os ovos seus filhos,
receios diminutos de longos incisivos,
nos cantos mais remotos da mente,
à espreita do instante oportuno
para atacar, roer, consumir-me
sem pressa, letais parasitas.

Agora é virar a página
e encontrar
que o caderno acabou
antes de iniciado.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Desmodus rotundus

Corre, vá lá,
procura, rápido, um pretexto para a desistência
e foge.
Amortalha-te no manto da invisibilidade
(Definir estado aqui já!),
antes que o bicho te ferre as ânsias...
(Ai!)
para logo a seguir sair de fininho,
borboletador, borboletando
magnífico,
(Oh...!)
a pingar
ping-ping-ping... ping-ping...
as quase sempre derradeiras gotas de sangue
tuas.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Pôr do poema

Os poemas assaltam assim sem avisar,
pela estrada fora,
e às vezes extraviam-se
no caminho
no instante preciso em que o olhar pousa no sol


que está



e já não está.