Tudo depois da poesia é uma merda.
Ademar Santos

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

No final da tarde (mais uma), outono

É a ironia, onde desliza a arma da nossa obscuridade.
Herberto Helder. “Poeta obscuro”. Os passos em volta

A praça arrefece comigo hoje:
aninho-me nos braços da cadeira
e envolvo-me no azul que me sobrou.
Mais sal do que sol mastigo: lábios.
Sinto rajadas brutais de calmaria
doce a agitarem-me os circuitos
da razão: talvez a mesma pomba,
o mesmo freguês. Apenas eu
sou outra que se dilui na nostalgia
dum gelado de morango. Sorrio ainda?
A praça explode comigo dentro.
Apanho os meus pedaços de gelo
e reinicio a caminhada à escuridão.

O homem segue os passos do cadáver
com um sorriso inútil. Neguei-me.