Tudo depois da poesia é uma merda.
Ademar Santos

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

E baixe o pano...

Sobre un proxecto frustrado que se funda?
E sobre esta penumbra que tolda os diálogos?
Sobre a urxencia sometida á presión dos entreactos?
Sobre o silencio oculto tras fonemas vacuos?
(U-lo apuntador que non responde
cando o chamo ao meu auxilio?)

Non hai papel que nutra
a caldeira rebentada do drama.
Escoan ácidos os excesos de impudor
e xa o público se nega ao desenlace.
De nada serve reclamar a devolución
dos cartos á farsa mal representada:
o fracaso permanece no sangue
e pinga.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

De mans feridas

Petéirame o tempo nas nocas
e sangro
lene
a agonía demorada.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Por um segundo apenas

Apeteceu-me sobre o (des)café,
entre o último poema e
as crianças que brincavam na praça,
escrever-te uma carta
com todas as palavras que se perderam.
Não encontrei nas mãos
os dedos suficientemente vivos.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A minha vez

Aparecesse Ela agora à porta,
sem o aviso prévio entregue,
e pronunciasse,
o dedo indicador na mão-revólver,
a sentença irrevogável:

―A seguir, vais tu!

fitá-la-ia, sem medos nem escusas,
e voltar-lhe-ia as costas para fazer as malas
de que não precisarei para essa viagem:
a travessia por que irei ao meu encontro,
o caminho para dentro de mim.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Terra!

Não preciso de inventar palavras
para reconhecer o universo
Apenas aspiro a criar o discurso 
que me devasse 
de dentro para fora
de baixo para cima
de lado a lado
como o que sou

A Descoberta

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Dos versos que voam

em 9 de Dezembro de 2010

Não há meios-paraísos
nem neve de que dias se façam:
inventam-se para isso versos
que como os passos também
dum tango à deux se dançam,
entrançados
no abandono os braços
que levam sem levar
num pacto de entrega
até ao fim da melodia.

Depois o verso é livre,
pássaro-tu.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Ante diem septimum Idus Decembris

E como fugir à transcendência
com que o dia se enfrenta,
esta ausência nítida de peso
e medida em segundos incontáveis?

Há em cada ano esse momento
em que torna a chover por volta
das três horas da tarde,
ninguém sabe bem para quê.


(Quiçá a lua resista esta intempérie
de deuses proscritos e vinho que se bebe
como sangue no dia equidistante
dum mês que perdeu o seu sentido.)

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Advento

Pasarei polo nadal como
se non existise (eu?, deus?):
un día igual ao outro día,
igual ao que ha de vir
(e son todos tan distintos!)
lámpadas led na partilla equitativa
dos afectos envurullados em papel de cores
e fitas vermellas que me prenden os pés
a un abeto de plástico verde.

Pasará por min o nadal como
se non existise (deus?, eu?).
Talvez mañá neve no presebe estrelas,
un sinal da cruz e unha bóla de vidro
dourado escache á luz da candea
derradeira do advento. Nos anacos
que o chan retén cortarei os pés
reberetados de fitas vermellas,
sen un grito, sen remorsos.

Ninguén me procure submetida
á sonora agresión das panxoliñas.

Escuridão nos passos

É neste silêncio que se vive
doravante noite e dia:
as mãos em cruz,
os olhos ao contrário,
cabelos emaranhados em labirinto,
as pernas sempre unidas aos pés
e ao pensamento, à boca.

É neste trilho que se escolhe
pelo eterno fora em sóis e luas:
o rumor do horizonte,
o mar sem derrota,
uma corcunda fendida de montanha,
as nuvens cristalinas que debruçam
ecos sobre a calma da poça.

Será nesse fluxo da voz apagada
que a claridade se vai reconstruir?

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A tua voz

Vem dum antigamente
este diálogo nosso pelas casas doutros,
do tempo em que morámos numa estrela,
quando em mim se estremecia a madrugada
com a tua voz de letras
gritando, sussurrando, nas cores do ecrã,
e a tua espera concluía enfim
noite dentro pela amanhecida minha.

Vem do dia que nunca iria ser
o monólogo a sós que trocamos,
do tempo em que os dedos faiscavam
ao contacto com o teclado que fazias vivo
num silêncio iluminado, numa luz calada,
numa distorção das horas roubadas
aos sonhos em que me ensinaste a descrer. 

(Não sei como sobrevivemos
quando estava escrito que a hecatombe
nos deveria rasgar em pedaços
impossíveis de recompor. Ainda bem.
Talvez foi só que sobrava um mundo por escrever?)